Comunicado Importante - 3 contos do blog serão publicados

É com muito orgulho que venho anunciar, que eu Debby Lennon e Sandra Franzoso iremos participar da antologia Jogos Criminais. A Antologia será lançada no dia 15/01/2011, Na Biblioteca Viriato Correa, situada a Rua Sena Madureira, 298 - Vila Mariana. Meus contos Anjo Perdido e Joana e Maria, já foram postados aqui no blog e agora está aperfeitoado e com mudanças no final,o mesmo acontece com o conto O Noivado da Sandra. Maiores informações em breve.

terça-feira, 23 de junho de 2009

A Fazenda do Vovô Jeremias

Prólogo
Era o lugar mais lindo do mundo a Fazenda de Vovô Jeremias. E todos que aquela terra conheceram jamais saíram de lá dizendo menos que isso.
Se o ar parecia melhor, a água com gosto divino, as frutas e comidas com um sabor excepcional ou, simplesmente, as pessoas se sentiam mais felizes do que em qualquer outro canto, ninguém realmente sabia explicar, apenas todos repetiam que não havia lugar mais lindo no mundo que a Fazenda de Vovô Jeremias.
Na verdade, nem era bem uma fazenda. Quem quisesse ser preciso, chamava mesmo de granja. Teve até um doido, que se dizia poeta lá da América, e escreveu uns versos num português de sotaque carregado para uma canção que terminava com uma frase mais ou menos assim: "(...) é um pedacinho do Paraíso que a bondade de Deus deixou cair e se esqueceu aqui na Terra essa Fazenda do Vovô Jeremias..."
Nas redondezas, a opinião não era diferente, menos para Dona Santa, uma velha solteirona, mais azeda que limão. "É coisa do Diabo, isso sim, esse lugar!", berrava para o pessoal da igreja no domingo. E o pastor reclamava com ela, por causa dessa birra insistente, mas Santa nunca desistiu até que a velhice e um ataque cardíaco a levaram.
CAPÍTULO I
Na casa de Seu Roberto foi um choque o telegrama. Ele releu para a família reunida (Dona Inajar e os filhos Vitório e Suzana):
- "Comunicamos falecimento Jeremias Moriz Chagas pt Corpo reclamado e extraditado por parente europeu distante pt Propriedade herdada por Vsa pt comparecer no local 29/08 às 10 h para leitura testamento pt"
Dona Inajar perguntou perturbada:
- Vovô Jeremias morreu?
- Morreu - respondeu-lhe o marido - e deixou a fazenda para nós. Não é maravilhoso?
Vitório ficou empolgado, afinal com seus dez anos já ouvira falar muito daquele lugar e estava curioso. Quem sabe a família se mudasse para lá? A vida na cidade lhe incomodava.
Suzana, porém, odiou a notícia. Seus trezes anos abominavam a idéia de ir ao campo e, sentia-se morrer quando pensava na perspectiva de a família se mudar para "o meio do mato".
Todavia, na data marcada, tendo Seu Roberto dirigido por três horas o carro, escutando a empolgação de Vitorio e Dona Inajar e os resmungos de Suzana, lá estavam todos eles para a leitura.
Quando o advogado guardou os papéis, Seu Roberto, Dona Inajar e Vitório abraçaram-se de alegria. Iam se mudar para ali, não mais cidade poluída e violenta, não mais vida agitada e nada saudável. Dormiriam aquela noite ali mesmo. Pela manhã, Seu Roberto cuidaria dos detalhes da mudança. Aquele era o paraíso no qual se abrigariam.
Paraíso? Era só mato, e mais mato, cheiro de estrume e bichos... Assim pensava e maldizia Suzana, enquanto seu irmão pulava de uma árvore para dentro de um rio. Morar ali era o Inferno, a menina repetia para si mesma.
À noite, o resto da família foi dormir agradecendo aos céus pelo presente. Porém, Suzana não conseguia fechar os olhos. Passar os próximos anos ali? Não! Não podia ser! O que de tão mal teria feito para Deus condená-la aquilo?
Foi quando escutou um som, um murmúrio, algo feio e desagradável que, todavia, capturou-lhe a atenção.
Desceu do beliche. Pegou uma vela na cozinha. Saiu escondida de todos. Sem entender como fazia aquilo, atravessou o terreno ao redor da casa. Cruzou um monte de terra lá depois da jabuticabeira, passou por um galinheiro já desativado até chegar numas pedras. A curiosidade, ou o que fosse, fez a garota encontrar o buraco que era a abertura de um túnel. Devia ter ficado louca, mas não conseguia parar. Foi descendo pelo aquele corredor até sair numa câmara ampla, iluminada por tochas.
O olha de Suzana prendeu-se na figura horrível sentada numa pedra no centro daquele cômodo. As feições eram mais feias, esqueléticas e a pele enrugada, o cabelo assanhado e o cheiro ainda pior do que ela saberia descrever. E havia os dentes, claro, aquilo abria a boca, tentando rir como uma pessoa e os dentes ficavam à mostra denunciando o que seu dono realmente era.
- Você é realmente uma coisinha terrível e desagradável, não é, Suzana? - disse o monstro para a menina - Qualquer pessoa no mundo acha isso aqui um paraíso, mas você vê essa terra como se fosse uma desgraça! Senta aí, em qualquer lugar.
Pela primeira vez na vida, Suzana estava realmente assustada. Obedeceu, sentou-se num canto rochoso e largou a vela no chão.
- Você não é um, quer dizer... - quase balbuciou - Gente feito você só existe em filme! Não é de verdade. Tô doida ou sonhando, não é?
- Nããão... - respondeu-lhe a coisa - nem está sonhando, nem é doida. E sim, existo e meu povo existe, embora não haja muitos de nós hoje em dia. Ah, você é uma ignorante! Nunca leu um livro fora da escola,não foi? Sua espécie já escreveu algumas boas obras sobre a minha espécie.
- Isso tudo é maluquice! Eu vou é fugir daqui! Não vai virar um morcego e me perseguir,não é?
- Pra quê? Não lembra aquela história de "hipnose"? Você não sai daqui porque não quero.
- Ai, meu Deus!
- Se falar esse nome de novo eu te arranco os dentes! Ou as tripas!
- Não, não falo, não. O que você vai fazer comigo?
- Tenha calma. Sou civilizado. Quero conversar primeiro. Meu nome é Lottar Gan Amon. Você é uma coisinha tão pertubadora como nunca vi. Foi chegar na fazenda e já me senti incomodado.
- Eu queria sair daqui!
- Já disse que não! Faz algo inteligente: pergunta por que estou aqui?
- Pra quê?
- Drama, para manter esse tom teatral. Meu povo adora isso. Na maior parte das vezes, agimos como se estivéssemos atuando para uma platéia atenta ou sendo lidos por alguém aficcionado por literatura fantástica. Na verdade, quase consigo ver um par de olhos me observando agora...
- Nunca te disseram que isso é coisa de doido?
- Arranquei a cabeça do último humano que tentou dizer.
- Ai.
- É, já arrancaram a minha, dói mais do que parece. Mas vamos ao que interessa: cinqüenta anos atrás, seu Vovô Jeremias encontrou-me moribundo na Europa. Diferente de você, ele tinha reverência pelos mitos e lendas. Trouxe-me escondido para o Brasil, colocou-me aqui e cuidou de mim. Teve uma idéia e fizemos um pacto.
- Como aquela história de pacto com o diabo?
- Não! Minha espécie não tem nada a ver com o Diabo. De onde tirou uma idéia estúpida dessas? De algum filme idiota?
- Foi.
- Não disse? Você devia ter lido livros. O pacto era para transformar esse lugar num paraíso. Ele me fornecia vítimas para minha fome e usei magia para que este lugar se tornasse o que seu avô sonhava. Mas aí aparece você: embora tenha o sangue dele, é uma alma idiota, seca, sem gosto algum pelo fantástico, pelo antigo, pelas lendas e que ofende minha obra! Fiz disto aqui um paraíso, mocinha! Um paraíso! E você só vem falar "em mato e estrume"?!!!
- Você leu minha mente?
- Claro! Para meu povo, telepatia é uma das cem coisas mais fáceis que existem.
- Adiantava se eu pedisse desculpa?
- Não.
- E o que vai fazer? Me deixar ir embora,né? Juro que não conto pra ninguém tudo isso.
- Embora? Rá! Tratar com você me deixou com muita fome. Seu sangue deve ter um gosto nojento, mas estou tão faminto que vai ter de servir assim mesmo. Vem. Não resista. Traga esse pescocinho para cá.
Continua...
CAPITULO 2
Vitorio estava no seu novo quarto na fazenda. Arrumava suas coisas e cantava uma canção divertida que aprendera na escola.Pensava em sua irmã, Suzana. Vitorio gostava dela. Tinha discussões e brigas como todo irmão, e as vezes ele sentia muita raiva dela, mas no momento estava preocupado com ela.
Havia muitas horas que sua tinha ido procura-la em seu quarto, mas ela não estava lá e nem em parte alguma da casa, como ele mesmo pode constatar.
Procurou por ela, gritou, chamou seu nome, e nada. Estava chegando a conclusão que sua irmã tinha feito uma loucura e fugido da fazenda que ela tanto odiara.
Foi falar com o pai, mas ele deu de ombros e disse que quando ela tivesse fome, apareceria. Afinal de contas pra onde ela poderia fugir em um lugar isolado como aquele?
Mas as horas foram passando e nada dela aparecer. Vitorio estava cada vez mais apreensivo.
Ficou com muita pena da irmã quando sentiu sua revolta em morar no campo, ele não conseguia entender o porque, afinal o lugar era muito agradável, tinha tantas coisas para se brincar, explorar...Ele havia adorado a fazenda!
Sem aviso uma pedrinha foi atirada na janela de seu quarto. Ele se assustou e quase gritou, mas mal deu tempo de abrir a boca, outra pedrinha foi atirada. Ele foi até a janela e sua irmã estava embaixo chamando por ele.
- O que foi Suzana? Por onde você andou? Te procurei o dia todo! E porque esta ai parada me olhando com essa cara?
- Para de gritar e desce aqui seu idiota! Não quero que o papai me veja!
Ele desceu correndo as escadas e foi ao encontro da irmã. Ela estava esquisita, pálida, ele ficou ainda mais preocupado.
- O que foi? Onde você estava? Ele perguntou alarmado.
- Não faça perguntas idiotas e venha comigo, vou te mostrar uma coisa bem legal que encontrei. Disse isso e soltou uma risada esquisita.
Vitorio estava com medo. Não sabia porque mas estava sentindo muito medo da sua irmã naquele momento. Ela estava estranha, com um olhar esquisito, sorrindo estranhamente, mas o mais apavorante era sua palidez. Ela parecia um fantasma!
Mesmo assim ele a seguiu. A curiosidade foi maior e ele queria saber o que sua irmã poderia ter encontrado que fosse tão legal assim.
Ela é claro o levou pelo mesmo caminho que havia seguido algumas horas antes. Quando chegou na entrada do túnel ela parou e se virou para o irmão. Ele não conseguiu segurar um grito apavorado. Sua irmã estava olhando pra ele e sorrindo, só que não era sua irmã e sim um monstro apavorante que Vitório não havia encontrado nem nos filmes mais assustadores que costumava ver no quarto da irmã escondido de seus pais.
Ela olhou pra ele, sorriu e disse:
- Não se assuste irmãozinho. Vou te apresentar o meu mestre, que em breve será seu mestre também. Você vai gostar dele, primeiro vai se assustar, mas ele fará você perceber que ele é o melhor que poderia te acontecer. Vem, vamos entrar.
Vitorio tentou correr, mas sua irmã o agarrou como se ele fosse um boneco, e o levou para o túnel, em direção ao seu mestre....
Continua....
Capítulo 3
Vitório tentou se acalmar e conversar com a irmã:
- Suzana... O que houve com você? Você não quer fazer isso comigo... Somos irmãos, nos amamos e...
Suzana deu um tapa em seu rosto:
- Cale a boca. Não somos irmãos. Agora sou superior à sua raça. Em pouco tempo você também será superior.
Resmungando e chorando seu irmão implorava..
- Não faça isso comigo irmãzinha - prendia as mãos nas paredes de pedra do túnel atrasando o caminho. Deixe-me voltar...
Vitório começou a gritar e alguns morcegos no teto do túnel se agitaram e começaram a revoada. Suzana se assustou e o soltou para proteger o rosto. Foi o suficiente para que ele começasse a correr para fora gritando por ajuda.
Entrou em casa com pressa e percebeu que Suzana não entrava na casa. Não tinha sido convidada, logo ele se sentia aliviado. Subiu as escadas correndo para chamar os pais, enquanto pacientemente Suzana esperava sentada no alpendre com um sorriso sinistro desenhado nos lábios.
Vitório empurrou a porta do quarto dos pais gritando:
- Papai, mamãe, socorro.... - ofegante não dizia coisa com coisa - Suzana... caverna... monstro...
Mas seus pais não acordavam. E então, ele percebeu uma leve névoa que envolvia o rosto dos pais.
- O que está acontecendo? Estou vivendo em um filme de terror... - sentou-se no chão, e começou a chorar.
E então, ouviu uns ruídos no sótão e decidiu investigar. Alguma coisa precisava fazer. E ficar sentado no chão chorando não ia resolver. Decidiu agir como os valentes personagens de livros e subiu para investigar. Subiu a escada cautelosamente e com um rangido empurrou o alçapão. Espirrou com a poeira e empurrou devagar. Estava escuro exceto por uma nesga de claridade da lua, vinda diretamente da clarabóia. Empurrou mais e se amaldiçoou mentalmente por não ter lembrado de pegar uma lanterna. Quase instantaneamente percebeu o interruptor e acendeu. Uma luz fraca cobriu o ambiente e enquanto seu olhar se acostumava a nova luz, começou a investigar o local.
Percebeu muitas caixas empilhadas e com indicações: "Louça da vovó", "Álbuns de Fotografia", "Livros Antigos do Jeremias - NÃO MEXER" Sua mão coçou ao ler a inscrição e começou a afastar as caixas com cuidado. Aproximou-se da janela e percebeu que sua irmã ainda estava pacientemente lá esperando por ele. E nem precisava descer para saber que seus pais permaneceriam enfeitiçados e dormindo por aquela névoa. Só restava a ele encontrar a solução. Então, abriu a caixa e o cheiro de poeira e mofo o fez espirrar novamente. Arrastou a caixa para a luz e começou a tirar os livros da caixa. Encontrou vários títulos conhecidos "O velho e o mar", "Crime e Castigo", "Admirável mundo novo", "O apanhador no campo de centeio". Sabia que eram famosos, seu pai tinha contado algumas histórias para ele, mas o que lhe chamou atenção, foi um livro encadernado em couro, sem título na lombada ou na frente. Abriu cuidadosamente, limpando a poeira e assustou-se ao perceber que era o diário de seu avô, abriu a primeira página ansioso e leu:
"Este é um relato dos fatos que antecederam minha chegada à fazenda e o pacto com Lottar Gan Amon. Se você está lendo isso, é porque não vivo mais entre vocês e a situação está fora de controle. Sendo assim, continue a leitura e entenderá o que é preciso fazer"
Vitório se acomodou da melhor maneira para ler o diário e sentiu que seria uma longa noite...
CONTINUA .
Capítulo 4
Dona Santa, a velha rabujenta, não proferira as inúmeras exclamações avessas à tal fazenda de Vovô Jeremias em vão, não; ao menos a longa vida que alí passou mostrou-lhe motivos que ajudaram a engrossar o caldo da desconfiança e do temor para com aquele lugar!
Essa mulher nunca presenciara com os próprios olhos qualquer cena, qualquer fato concreto na vida isolada do sr. Jeremias que a enchesse de razões para afirmar que aquele homem possuía estranhos poderes ou, quem sabe, tivesse até algum pacto demoníaco...Uma coisa era certa, toda vez que uma pessoa da cidade era dada como desaparecida, dona Santa passava noites horríveis, com pesadelos horripilantes que chegavem - ao que parece - a transpôr a tênue linha do onírico, caindo no abismo da realidade, e uma realidade dura e cruel, pois se sonhava com um monstro pavoroso, de olhos incandescentes e longos caninos perseguindo uma vítima, podia ter certeza de que alguém estaria em vias de desaparecer e... desaparecia mesmo! Só não sabia quem seria a vítima, mas, o rosto do monstro, ahhh, esse era sempre o mesmo, garras enormes, uma cor pálida de morto, um morto-vivo, parecia até coisa de... vampiro! Bem, mas vampiros eram seres danados, frutos do imaginário coletivo e de uma porção de lendas espalhadas pelo mundo afora, não é verdade? E, religiosa como era, fazia suas orações diárias e pedia muita proteção para sí e para os outros.
- Há mais mistérios entre o céu e a terra que a gente não consegue imaginar! - dizia consigo mesma.
E o tempo passou depressa, devorando a saúde e a vitalidade daquela senhora até devolvê-la ao pó de onde viera...

... ... ... ... ... ... ...

Vitório nada sabia sobre isso, mas, curioso como estava e com a imaginação afiada comum num garoto de dez anos, abriu o diário e adentrou uma madrugada que nunca mais esqueceria. De uma coisa tinha certeza, lera o suficiente para concluir que ou seu avô era louco e dotado de uma imaginação fora do comum, ou, então, a fazenda que seu pai herdara fora palco de uma sórdida e nefasta mancomunação entre Jeremias e um filho das trevas, um vampiro real... que coisa!
A história começa em 1949, um pouco depois do final da 2a. Grande Guerra, quando Jeremias era ainda um homem de 32 anos de idade, cheio de vitalidade e vontade de abraçar o mundo... Trabalhava na marinha mercante e pouco pisava o solo firme, mas, em compensação, conseguía guardar práticamente todo seu salário, pois o emprego lhe oferecia moradia e alimentação, além, é lógico, de inúmeros encontros amorosos clandestinos.
Se marinheiro possuia fama de aventureiro no amor, ele não ficava para trás, justificando muito bem seu apelido de "big man", seja pela sua compleição física como, também, pelo seu jeito especial de conquistar mulheres...
- Mulher, prá mim, só 'filet mignon', boa de bolso e de rebolado! - brincava com os demais, vangloriando-se das inúmeras histórias com o sexo frágil.
Numa noite quente e de lua cheia, o feitiço virou contra o feiticeiro; ele foi cortejado por uma mulher muito linda, fascinante e sedutora e, ao mesmo tempo, exótica e misteriosa, dona de uma beleza escultural inigualável, uma pele tão alva quanto a luz do luar.
Nunca acontecara coisa assim; não parava de pensar nela o dia inteirinho e,à noite, no mesmo local, lá estava ela esperando-o, sabendo-o fora de sí e louco de vontade em possuí-la. Num desses momentos mágicos, levava-o até seu camarote, possuindo-o com uma voracidade e um rítmo incomuns que no dia seguinte se sentia como que anestesiado ou, quem sabe, embriagado, e nunca havia sentido algo assim tão delicioso com qualquer mulher que já conhecera!
Contava as horas do dia para, depois de seu expediente, ir direto ao encontro dessa fantástica fêmea, que já o esperava com o trinco da porta aberto... E cada noite que passava, tornava-se mais afoito por encontrá-la o mais rápidamente possível, e o interessante é que ela permanecia o dia inteiro alí trancafiada e com a janela fechada, como se a noite fosse seu habitat natural. E foi numa dessas noites que ela o mordeu de leve na jugular, sugando um pouco de seu sangue, o suficiente para deixá-lo louco de prazer, como se estivesse viajando num sonho onde se todas as suas células estivessem pegando fogo e essa incandescência estimulasse ainda mais seu gozo da cabeça aos pés...
- Coisa louca, ela sabe fazer isso tudo e nem deixa marcas no dia seguinte! Mulher nenhuma me fez sentir isso, nenhuma!
E como tudo tem seu preço, o que no início era novo e delicioso, acabou virando uma necessidade, e se sentia como que usado por ela - um objeto - e, pior de tudo, não conseguia mais ficar sem aquele rápido beijo mordido que o permitia alçar vôo e tocar as nuvens em êxtase total sem tirar os pés do chão...
- Quero mais, preciso mais, você só me dá uma míngua e, mesmo assim, só quenao está a fim...
- Calma, querido, reservo grandes surpresas para tí, é apenas uma questão de tempo! Temos de fazer aquela tal viagem, até Varna, na Bulgária, estás lembrado?
- Mas, e meu emprego? Não tenho permissão de sair assim, tão de repente, eu...
- Já te disse que terás uma surpresa e tanto, e verás o quão medíocre ainda és neste teu emprego também medíocre se comparado ao que te possibilitarei num futuro próximo! Não gostas de jogar? E te garanto que o prêmio será tã surpreendente que me agradecerás de joelhos por tudo que te permitirei ter...
- Mas, nem conheço você direito, apenas essas noites em que...
- Cala-te! Se falares assim uma vez mais acabo contigo! Prefiro ouvir um 'não' teu, curto e grosso, porém decidido; saiba que odeio indecisos, e tu estás me deixando irritada com isso! Vmaos, tens de decidir agora, caso contrário te deixo aqui e nunca mais me verás, muito menos...
- Não, não!!! Eu... bem, lógico que quero ir, mas tenho de preparar terreno e...
- Tolinho, teu terreno é isto aqui! - e lhe aplicou uma mordida profunda, o suficiente para deixá-lo em estado hipnótico, semi-consciente e totalmente entregue à vontade de Frantiska.

... ... ... ... ... ... ...

Quando voltou a sí, encontrou-se num lugar completamente estranho, escuro e inimaginável, parecendo mais uma cripta - sim, uma enorme cripta - onde dava para se ver enormes tumulos divididos em dois segmentos de seis gavetas cada. Havia poucas velas acesas que permitiam iluminar bem pouco o ambiente.
- Seja benvindo, caro Jeremias, e fique à vontade! Apenas não te assustes com o que estás vendo... E peço desculpas pela forma como aqui chegaste, mas dentro de instantes compreenderás tudo, e dentro do teu livre-arbítrio poderás escolher entre voltar à tua vida de antes ou, então, ajudar-me e, a partir daí, conquistar, assim, os benesses que te farão jus...
O marinheiro não acreditava no que estava vendo e ouvindo, um misto de história macabra e realidade.
- E quando sairei daqui!?
- Quando escutar o que tenho a te falar e, como já foi dito, fará a escolha que quizer. Senta-te, estás um pouco tonto mas isso já passa! Meu nome é Lottar Gan Amom e sou o que realmente imaginas, um vampiro! - ante o olhar confuso e atônito do indefeso homem ele continuou...
- Sou antigo, tenho mais de 300 anos, e já presenciei fatos indescritíveis no decorrer de todo esse tempo. Como posso ter essa idade? Hahaha, ao tornar-me um vampiro abrí mão de minha vida, morrí para ela mas, em compensação, renascí com a morte, acredite, por isso sou predaror e me alimento de sangue - a fonte inesgotável de minhas energias e de minha imortalidade!
- Ma... Mas eu...
- Sem mas, pois não és estúpido e sabes muito bem que falo a verdade! Mas não estou aqui para oferecer-te a eternidade, em absoluto! Pelas nossas leis próprias não me é permitido conceber esse dom a qualquer um, temos códigos de ética nossos e os mesmos têm de ser cumpridos! Quero te propor uma coisa, necessito de tua ajuda e meus poderes telepsíquicos me fizeram descobrir-te em meio a toda essa massa humana, pois és um ser especial, tens vitalidade, energia, beleza física, personalidade forte e uma têmpera sexual que faz inveja a muitos dos de tua espécie... Aqui em meu território, já não é mais possível me comprazer em meus limites, entendes, o lugar é pequeno, a população tem aumentado sensivelmente e estou percebendo que necessito de um lugar maior e melhor, onde possa me transferir juntamente com minha amada Frantiska! e sei que em teu país, o Brasil, há lugar para muita gente, muita gente que pode vir a se tornar presa fácil e, lógico, amparado em tua ajuda e colaboração. Para isso, basta apenas que me ajude a firmar meu território por lá e te farei meu servo fiel, onde terás propriedades, dinheiro e, o principal, fartura e abundância em tua vida mortal. Veja bem, não te proponho em absoluto conceder-te o Dom das Trevas... reinarei juntamente com minha parceira por tempos que não conceberias imaginar, e serás meu primeiro ajudante - um fiel ajudante em quem depositarei meu segredo e dividirei direitos e obrigações. Mas tuas obrigações serão justas, precisas e imutáveis; nunca me farás quaisquer ameaças à guiza de chantagem, nunca! E te falo isso por experiência própria, adiantando-te que se isso um dia vier a a contecer, terás um fim horrível, esse é o preço que pagarás por tua infidelidade. Mas, ao contrário disso tudo, terás uma vida normal invejável, serás respeitado por teus domínios, teus bens e tua imagem social.
- E se eu não quizer saber disso? Se quizer ir embora agora e nunca mais voltar, como é que...
- Então vais e te prometo que nunca mais saberás de mim. Mas pensa bem, há oportunidades e ofertas irrecusáveis que chegam escancaradas aos olhos que, quando negadas, nunca mais voltarão a nos seduzir, nunca mais! É um direito teu recusar, mas tenho certeza que teu espírito aventureiro e desejoso do querer mais e mais não há de te trair agora, pense bem! E... Um detalhe a mais, apenas saiba que, como parte de nosso pacto, no dia que vieres a falecer, teu corpo será reclamado por um filho meu que continuará por aqui por um bom tempo ainda, e serás enterrado aqui, neste solo. É só!
- Mas por quê deverei ser enterrado aqui, neste lugar!?
- Por uma questão de tradição nossa, uma homenagem aos nossos que já deixaram de existir ou que já se foram para outros lugares distantes, e a tí próprio, que propiciarias uma nova ramificação em tua terra, entendeste...?
O diário era bem extenso, mas Vitorio leu o suficiente para, compreender a trama densa e horrível que representou e ainda representava a fazenda de vovô Jeremias. Estava atônito, não sabia o que fazer, sua irmã o esperava lá fora e sabia muito bem quais eram suas intenções...


... ... ... ... ... ... ...

A leitura foi o suficiente para que Vitório entendesse o no que estava envolvido. Mas queria ajudar Suzana, e não sabia como. Ela era um deles agora e o queria. E estava lá fora, ele podia ouvi-la cantar uma música sombria, numa língua que lhe soou estranha, porém a horripilação tomava conta de seu corpo. Largou o diário no chão, andando de um lado a outro freneticamente, tomado pelo desespero total.
_ Irmãozinho... Eu tenho todo o tempo do mundo! A eternidade, pra ser mais clara. Mas se sair daí logo, tudo ficará melhor, especialmente para nós!
A voz dela agora era mais suave, mas carregada de ironia. E ele sabia que não podia fugir.
_ Venha, Vitório, venha para nós...Venha para a vida eterna! Aceite a dádiva que lhe foi dada.
Ele percebe agora outras vozes, como num coro, e eles repetem a frase várias vezes.
_ Venha para nós, venha para a eternidade...
Os sons externos mesclam-se com seus pensamentos perturbados pela melodia macabra que toma conta de seus ouvidos. Tudo girando agora. Ele escuta o riso deliberado de Suzana, e as outras vozes repetem a frase incessantemente. Tudo girando, o desespero em cada parte do corpo. Tudo girando.
A claridade o desperta, está deitado em sua cama, Suzana abriu as cortinas rispidamente. Sua cabeça dói e sente-se atordoado. Aos poucos entende que desmaiou e fora levado de volta a casa. Ela se aproxima dele, toca em suas mãos, mas Vitório bruscamente sai correndo.
_ Não há para onde fugir..._ Ela fala e sua voz parece penetrar a mente dele._ Você é o escolhido, aceite seu destino, essa dádiva que lhe foi dada. Vovó Jeremias estará te guiando. Ele e os outros. Não tenha medo, você não está só.
Era clara a maldição que recairia sobre ele. Enquanto corria inevitavelmente, a voz de Suzana e suas palavras o perseguiam. Não teria como escapar do seu macabro destino.

Um comentário:

Getúlio disse...

muito bom mas é quase um livro rs

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