Comunicado Importante - 3 contos do blog serão publicados

É com muito orgulho que venho anunciar, que eu Debby Lennon e Sandra Franzoso iremos participar da antologia Jogos Criminais. A Antologia será lançada no dia 15/01/2011, Na Biblioteca Viriato Correa, situada a Rua Sena Madureira, 298 - Vila Mariana. Meus contos Anjo Perdido e Joana e Maria, já foram postados aqui no blog e agora está aperfeitoado e com mudanças no final,o mesmo acontece com o conto O Noivado da Sandra. Maiores informações em breve.

domingo, 9 de agosto de 2009

Desconhecido

Prezados,

Na condição de convidado, trago-lhes um conto curto e escrito fora dos meus padrões normais de escrita. Tentei, com esse conto, escrito já há algum tempo, exercitar frases mais curtas, a exemplo de outro postado em uma coluna do Norberto/Vic em ocasião diversa.

Não é exatamente sobre o outro lado da mente, mas creio adequar-se ao inesperado, sempre ontido naquilo que não conhecemos plenamente.

Abraços a todos.


DESCONHECIDO

Já era tarde, e as árvores que passavam pelas janelas do ônibus eram tão somente linhas um pouco mais negras em meio à escuridão da noite. Fechou o livro e apagou a lâmpada acima de sua poltrona. A cabeça agora pendia para o lado direito, e a mente voltava-se para a mata fechada que ela pouco conseguia ver naquela altura da noite.

Sempre que viajava para visitar seus pais, pensava, ao olhar para aquela vegetação já familiar, sobre o que poderia haver por detrás das folhas verdes – apenas sombras à noite – que beiravam o caminho da estrada.

Não era frio, mas precisou interromper seus pensamentos para pegar um casaco na mochila. Olhou para a poltrona ao lado. Ficara aliviada quando a senhora cheia de histórias e valores dormira. Somente assim pôde começar sua leitura sobre Dr. Jeckill e Dr. Hide, a dicotomia médico/monstro que a fazia pensar no que mais havia por trás das pessoas. Onde estaria o lado monstro da "quase-freira" que dormia no banco ao lado?

O ônibus estava lotado, e a época da Páscoa de fato movimentava as estradas. Não sabia se eram as pessoas que movimentavam as rodovias ou se era a própria Páscoa que agia materializada sobre o asfalto. Lembrou do garoto que empanturrava-se de chocolate no início da viagem. “Teria ele já vomitado?”. Não. Precisaria de mais alguns bombons, mas não tardaria.

Por um instante, quis saber onde estava o outro lado das pessoas que lhe cercavam. Olhou novamente para as árvores e esqueceu da idéia. Retomou o pensamento sobre o que havia após as árvores. O que haveria do ouro lado?

Com os pensamentos misturados à escuridão das árvores, estava demasiadamente concentrada para perceber que o garoto sujo de chocolate que corria ao banheiro não queria vomitar. Se visse aquele jovem rosto por uma fração de segundo, teria reconhecido o sinal do medo.

Foi quando pareceu ter visto uma sombra mais escura na mata que as luzes do ônibus se apagaram. Ouviu-se um único grito vindo das poltronas da frente. O medo a fez desejar que as luzes não voltassem.

Em princípio, sentiu-se aliviada por não passar pelo estranho evento sozinha. Havia mais algumas pessoas com quem compartilharia aquele momento. Em seguida, frustrou-se por não saber como os outros reagiam. E por alguns segundos ninguém ousou pronunciar uma palavra sequer.

Ainda não era conhecido o motivo da escuridão, mas voltou a concentrar-se no interior do ônibus quando uma senhora gorda ergueu-se da poltrona n. 4 e bateu secamente na cabine do motorista, exigindo explicações. Não houve resposta. Se a senhora houvesse permanecido na poltrona, talvez não tivesse o mesmo destino a que foi entregue motorista.

Bruscamente, alguém lhe atacou pelas costas, vindo de algum ponto desconhecido no ônibus, e o grito que se ouviu depois ficou claro até mesmo para quem jamais havia visto alguém morrer – e ver, naquela altura da noite, não era privilégio de muitos.

O pânico exalava de cada corpo ainda vivo, e os gritos de pavor seguiram o grito de morte. Um a um, os passageiros foram ecoando o que começou nas poltronas da frente. Não sentiu medo de morrer. Sentiu medo de ser a última a morrer. Não se importava com seu destino, desde que fosse igual ao dos demais.

De fato, ninguém foi poupado. As lágrimas de sangue não demoraram a escorrer de seu pescoço, e a imagem que a garota pôde ver em seus últimos reflexos foi a de um corpo enorme caminhando – como quem volta para casa – em direção à mata fechada.
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Leonardo Fripp/Croatan

sábado, 8 de agosto de 2009

Sonhos

Salve!

Surfando nas ondas da grande, revolta e farta rede mundial de computadores, topei com este conto e acredito que ele deva ser publicado aqui. O crédito ao autor esta no final do conto. Não o conheço, mas é interessante.

Desta vez, nada de horror, aborda o lado negro da mente, afinal o que é o lado negro da mente senão aquilo que a grande maioria não conhece e os poucos que sabe, não podem escrever sobre? Sendo assim, tudo que investiga a mente humana esta na calota negra, aquela grande e imensa porção do cérebro que pouco é explorada, e onde o sol nunca se faz ver...

Bons sonhos, meus queridos...

Salut!

N.E.I.'.

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Sonhos


Deitada de costas, ela estava pensando:

- (Ele tinha razão quando me disse que o divã do psicólogo nunca é muito cômodo.)

- Estava dizendo que teve um sonho.

- (Mas, que coisa fez tanta graça dos lacanianos paulistanos?)

- Estava pensando em alguma coisa?

- Sim ... não ... Sim, eu teve um sonho a noite passada.

- Quer me contar?

- Quero. Eu estava deitada numa cama. A habitação estava a meia luz. De repente, entra um homem abrindo violentamente a porta. Se aproxima à cama, olha fixo para mim, tira uma arma de sua cintura e atira em mim. Eu morro.

- Esse homem lhe é conhecido? Ou parecido com alguém?

- Não dá para ver a cara dele.

- Como assim?

- Eu estou deitada de costas à porta e todo acontece rapidamente. Eu vejo a cena de fora, como num filme. A cama está no lado esquerdo do quarto. Tem uma janela no lado direito por onde entra a luz. Quase no centro fica a porta pela qual entra o homem.

- Não dá tempo de ficar apavorada, não é?

- Não ... heim ... não, não dá. (Pavor não. O que eu estava sentindo?).

- E você disse que o homem não lhe lembra a ninguém em particular ...

- Era um homem grandão, de movimentos bruscos, como Stallone.

- Como quem?

- Como Silvester Stallone, o ator de cinema.

- E porque ele ia querer matá-la?

- Ele queria realmente me matar? Sim, claro. Por que ele queria me matar? ... Não sei, estou confusa.

- Ele atira em você, ele mata você, não é?

- Sim, sim. Ele atira três tiros e me mata.

- E ai você acordou?

- Acordei.

- E depois de acordar sentiu medo?

- Não, eu estava confusa.

- Não sentiu medo?

- Sim, claro, sabendo que ia morrer, eu estava como com medo.

- Claro, depois que morreu já não dava para sentir mais nada.

Paciente e psicólogo riram. Ele lembrou a hora e a sessão terminou na paz dos honorários.


Pouco antes da sessão de psicanálise ela conheceu um rapaz numa livraria. Os dois estavam procurando novidades em literatura, o que chamou à atenção de ambos. Ai começou o diálogo, foram a tomar um café e continuaram a conversa. Primeiro falaram de romances modernos, mas quando ela disse que de ai a pouco ia ter sua terapia, o diálogo mudou de rumo: passou para Freud, a neurose moderna, a depressão e coisas similares. Quando ela disse que o seu terapeuta era um lacaniano paulistano, ele tentou em vão esconder seu sorriso. Trocaram números de telefone para continuar a conversa. Dois dias depois marcaram um novo encontro. O tema, desde o início, foi psicologia.

- Sim, eu já li bastante Freud, mas não tenho sacos para ser psicólogo. Agüentar a conversa de pessoas que o único problema real que tem é que não sabem o que fazer com o tempo. Claro que tem pacientes interessantes, como os de Freud, mas também ele deve ter suportado imbecis que nem deram para ser citados. Por outra parte, das pessoas que acho interessantes, não quero ser o psicólogo. Quero ser o amigo, por exemplo. Também não quero ser o psicólogo de meus amigos. Por isso não gosto de interpretar os sonhos por interpretar.

- Você sabe interpretar sonhos? Eu teve um sonho que contei para meu psicólogo, mas ele ainda não me disse nada. Como se faz para interpretar um sonho?

- Com talento. Interpretar um sonho requer de uma habilidade especial. Tem envolvida uma questão de sensibilidade. O inconsciente é como o Apolo de Heráclito: nada diz, nem nada cala, só dá sinais. A chave para decifrar a maioria dos sonhos é algum sentimento. Algum sentimento que não condisse com o que está acontecendo no sonho. Por isso é que um psicólogo precisa de uma sensibilidade especial.

- Mas Freud tem uma teoria da interpretação dos sonhos, onde o fundamental é que o sonho é a expressão de algum desejo oculto, que a pessoa não quer reconhecer.

- Sim, mas isso não significa nada. Um sonho é multiface e expressa, misturados, muitos desejos de diferentes tipos. Sempre é fácil achar algum desejo expresso em qualquer sonho. Mas isso não vale nada. É como o Édipo. Freud usa o Édipo como chave mestre e os psicólogos com cavalo na batalha: o Édipo corre com o prejuízo e eles vão encima. Vasculhando sempre se chega ao Édipo, mas o problema não é chegar, mas como se chega. O Édipo e o happy end da terapia freudiana, mas muitos psicólogos reagem como as pessoas ingênuas ante um filme hollywoodiano: têm tanta ansiedade pelo fim, que acham que o fim é todo. O final sozinho não é um final, precisa do desenvolvimento, da ansiedade da qual é o final. Se uma mulher dizer: ``me corria um homem com uma faca'' e o psicólogo interpreta logo: ``o homem é o seu pai e a faca o pênis'', dificilmente esteja prestando algum serviço para seu paciente. Tem que ler Freud não olhando para a teoria que ele esta expondo, mas vendo como ele interpreta. Ver como Freud descreve os sentimentos: ``um pavor desmedido'', ``um desejo contraditório'', ``uma alegria apática''. Muitos psicólogos não vão ao detalhe do sentimento porque eles próprios não sentem com detalhe. O psicólogo não pode ser menos sensível que o paciente.

- Eu não tinha pensado nisso, pode ser. (Mas ele não está falando do meu psicólogo, pois nem conhece ele.) Que pena que você não quer interpretar sonhos de amigos, pois eu gostaria que interprete o meu. Mas fique tranqüilo, vou respeitar sua posição.

- Outra maneira de ver a coisa é que o importante num sonho quase sempre é um detalhe. Sem sensibilidade esse detalhe passa desapercebido. Aliás, se podermos falar de intenção do sonho, essa intenção é que o detalhe passe desapercebido. Se o paciente sabe psicanálise tem um outro motivo: falar para a pessoa certa, não revelar segredos para aqueles que só vão criar confusão. Nem todo o que um paciente oculta do psicólogo é por causa da malvada repressão.


Terminou o encontro e ela ficou pensando. Um detalhe. O detalhe que chamava a atenção no seu sonho era a iluminação da habitação. A luz vinha da janela da direita e dava um clima dramático à situação. Mas, que significado pode ter a iluminação? Seria que ela estava ocultando o essencial a seu psicólogo não pela ``malvada repressão'', mas para que aquele não entrasse no seu inconsciente como um elefante numa loja de louças? Mas o seu psicólogo é um bom psicólogo, um lacaniano paulistano. Não é que ele não seja sensível, é só sua postura de psicólogo. Continuou pensando:

- (Também eu não sei ao certo se o papel da sensibilidade é tão importante num psicólogo. O homem seu pai, e a faca o pênis dele. Não, meu psicólogo não vai ser tão burro para dizer: ``Olha, o homem que entra pela porta é o seu pai, e o revolver o pênis dele''. Claro que isso não explica nada. Bom, explica porque eu acordei tranqüila e contenta. Detalhes nos sentimentos? Como se tiver realizado um antigo desejo. Vem? O desejo está presente. Sim, claro, sempre esta presente.)


Por fim chegou o dia da próxima sessão. Ela esperava ansiosa pela interpretação do seu sonho. O primeiro que ela fez foi perguntar. Ele respondeu:

- Um sonho deve ser interpretado em contexto. Não é como um texto sagrado que tem normas absolutas para sua interpretação.

- Mas Freud falou que sonho expressa desejo.

- Que desejo você vê se expressar no seu sonho?

- Não sei, para mim está confuso.

- Mas no sonho você morre. Você quer morrer?

- Não, não, eu não quero morrer. Eu tenho esperança de que alguma coisa de maravilhosa vai acontecer logo na minha vida.

- Fala como se tivesse conhecido alguém.

- Sim, conheci um rapaz bem interessante, mas não é isso, não. E um sentimento de realização pessoal. Mas, o que me importa é a interpretação do sonho.

- Você fala do sonho e fala de desejo.

- Freud fala de desejo.

- Sim, mas você trouxe o desejo até aqui.

- Sim, eu falei do desejo.

- Mas você fala que não quer morrer e o seu sonho mostra você morrendo. Portanto, a morte do sonho representa uma outra coisa.

- Representar?

- Não. Representa. A sua morte no sonho representa alguma outra coisa.

- Não, não, eu estou representando minha morte. Não, o sonho representa minha morte. Estou confundida. Como diz?

- Fique tranqüila, sua confusão mostra que estamos no caminho certo. Eu disse que sua morte no sonho representa alguma outra coisa.

- Uma relação sexual. Eros e Thánatos. O meu desejo oculto de ter uma relação sexual com meu pai, toma a forma de ele me matando. (Página 475, tombo 4, Obras Completas de Freud. E para isso lhe pago?)

- E isso explica também o medo.

- (O medo de que o elefante entre na loja de louças.) Mas o meu pai não se parece a Stallone.

- É a imagem infantil do pai grande e forte.

- Ah ... (Será?)

A sessão continuou com outras páginas de Freud e terminou na paz dos honorários. E como a vida é muitas vezes uma sucessão de encontros e desencontros, dias depois da sessão de psicanálise aconteceu um outro encontro.


- O seu psicólogo deu uma interpretação surpreendente de seu sonho. Foi?

- Não seja irônico, por favor, que para mim é coisa séria.

- Perdão. Não quis magoá-la.

- Para mim a interpretação desse sonho é fundamental.

- Como a interpretação? Que raro! Você fala de interpretação de uma maneira esquizofrênica. Por um lado com uma ênfase e um sentimento de paixão difíceis de compreender. Por outro lado como se a interpretação que está procurando fosse um jogo matemático, uma coisa lógica e fria. Esqueça da interpretação e pense no seu sonho de uma outra maneira. Como os antigos, por exemplo.

- Como se meu sonho está mostrando meu futuro. Você fala sério?

- Falo. Se lembra do alpinista de Freud que sonhava que caia da montanha? Ele sonhou seu futuro. As vezes, o inconsciente sabe mais do futuro que a consciência.

- (Mas, se eu desejar minha própria morte, por que acordei tão feliz?) Então agora não entendo.

- O mais importante de um sonho nunca é o primeiro que vê a pessoa que o teve. Pode até estar explícito, mas não vai ser o primeiro que vê. Seu psicólogo não falou nisso?

- Parece que você não gosta do meu psicólogo, mas ele tem boa fama.

- Mas a fama é a opinião dos outros. Você que acha?

- Eu acho ele bom. Só que parece não ter cultura geral. Não conhecia a Stallone.

- Mas você gosta dos filmes de Stallone?

- Nem tanto. Mas também não sabia que era Fellini.

- Bom, ai a coisa complica.

- É mesmo?

- Sim, porque existe uma imagem coletiva, um sentimento do que é Fellini. Se seu psicólogo não sabe quem é Fellini o paciente vai quer dar uma idéia ``objetiva'' de Fellini, ou seja, essa imagem coletiva, em vez de expressar o seu sentimento. Então o psicólogo, que não conhece o sentimento geral, deve diferenciar o sentimento particular do paciente. As vezes, o que já é difícil torna-se impossível. Eu já teve esse problema na minha própria terapia. Uma vez comecei a falar de Safo e minha psicóloga não sabia que foi Safo. Perdeu uma porta aberta, mas enganosa, para o tema da homossexualidade.

Ela ironizou com um leve sorriso:

- Mas, você gosta da poesia lésbica.

- Tanto como para fazer o esforço de aprender eólio.

- Os ventos trazem lembranças.

- Quando falam do ventos da antigüidade, eu me lembro do Bóreas.

- Ah, se eu for sua psicóloga, diria que no seu aprendizado do eólio está presente o seu desejo de raptar sua mãe quando ela era donzela.

- Mas todos os ventos frios do Norte raptam donzelas.

Os dois riram das ironias quase ininteligíveis. Ela continuou:

- Passando da ironia para a fofoca. Você que leu Safo em eólio, acha que ela era homossexual?

- Eu acho que não. Acho que os fofoqueiros da antigüidade injustiçaram ela com uma difamação, tal vez por inveja.

- E isso sim que tem que ver com a sua mãe.

- Tem, com certeza, tem.

- Então, você percebeu? Começamos falando de romances modernos e psicanálise e agora estamos chegando aos temas verdadeiramente importantes: os clássicos, a poesia ...

- E o cinema.

O rosto de ela mudou. Ele falou:

- Por que você ficou tão séria? Aconteceu alguma coisa?

- Não, não. Eu gosto tanto do teatro e do cinema. Participo de um grupo de teatro experimental, mas por vergonha ou por medo da incompreensão não falo para quase ninguém. Mas é como se você tivesse adivinhado.

- Não adivinhei, não. O sentimento com que você falou do cinema. Parecia machucada pelo fato de seu psicólogo não saber que é Fellini. Vai participar de alguma peça?

- Não, mas eu fiz um teste. Não para uma peça, para um filme.

- Um filme?

- Sim. Glaúber Rocha vai rodar uma adaptação da peça Melissa, de Augusto Boal.

- Eu estou sabendo. Já li na Folha. Eu já assisti Melissa no Rio, com direção do próprio Boal.

- Eu nunca assisti a peça, mas li o livro uma dúzia de vezes.

- Um teste para que papel?

Ela ficou com vergonha, e logo falou:

- O papel de Melissa.

- Melissa? Tomara que consiga esse papel. Parece uma coisa muito importante para você. E eu tenho a sensação de que seria uma Melissa antológica. Mas, que personagem complicada! É como nas obras de Shakespeare, a gente sabe o final desde o princípio, mas, mesmo assim, o final surpreende. Quando vai ficar sabendo se foi a escolhida?

- Amanhã.

Ficaram se olhando um para outro em silêncio.


Momentos antes de sua sessão de psicanálise. O telefone tocou. Deram a notícia: ela era a escolhida para Melissa. Ela dava um passo para um lado, um outro para outro lado, queria pular, queria dançar, queria gritar, queria chorar. Aos poucos foi se acalmando. Lembrou-se da sua terapia. Ai veio um sentimento de raiva e pensou:

- (Mas que burro, que burro, que burro que é o meu psicólogo. Eu tenho que parar de jogar fora tempo e dinheiro e dar bola somente às pressões das pessoas que admiro.)

Ela entrou no consultório do psicólogo, olhou aos olhos dele, e lhe diz:

- Você é um burro, e eu não vou vir mais.

E saiu batendo a porta. Chegou na sua casa e ligou para marcar um encontro com ele. Falou da novidade.


- Parabéns. Você conseguiu. Eu sinto que vai fazer uma Melissa memorável.

- Larguei de meu psicólogo. Quando uma pessoa tem algum desejo muito intenso, parece que tem a necessidade de ocultá-lo para que se realizar.

- Ou pelo menos não contar para os psicólogos burros.

- Você também acha? Eu gosto tanto de você ...


Começou a filmagem. Glaúber surpreendeu todo mundo quando disse que o primeiro a filmar ia ser o final, a última cena. Ascenderam os refletores e Glaúber deu a ordem de rodar.

Ficou na cama de costas à porta, como está na peça. O grandão ficou sabendo da traição de Melissa. Entrou violentamente no quarto e matou Melissa.

Ela não podia acreditar tanta alegria. Seu sonho tornava-se realidade.

(c) 1998 Carlos González

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sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Vá e não peques mais

- Me perdoe Padre, porque eu pequei...

Gustavo inala sofregamente todo o ar cabível em seus pulmões e senta-se de súbito em sua cama. As imagens a sua frente eram pouco nítidas, em parte pela escuridão de seu pequeno quarto na pensão de Dona Olívia, em parte pela confusão provocada por um sonho recorrente, assombrado por vozes do passado. Inclina seu corpo e tateia o soalho do dormitório, em busca de seu maço de cigarro e isqueiro. Pagava R$ 250,00 a mais por mês, para Dona Olívia, só para ter o privilégio de não dividir o quarto e poder socorrer-se em algumas tragadas nos momentos críticos, sem ser censurado por um eventual companheiro.

Ajeita os travesseiros na cabeceira da cama, criando um encosto estofado e confortável para suas costas. Leva o cigarro a boca e dá um longa tragada. Seus olhos se habituam à escuridão da madrugada e os limites de seu pequeno quarto podem ser vislumbrados, ainda que sutilmente. Porém, não era a visão do quarto que ansiava, mas as imagens que provocariam mais uma noite de insônia. Reclina sua cabeça para trás e, ao mesmo tempo em que expele uma bolha expansível de fumaça, fecha os olhos, mergulhando na obscuridade de suas memórias...

Não podia deixar de supor que sua vida teria sido plena, se não fosse por uma tarde, num confessionário, há quase seis anos.

Gustavo tinha vinte e oito anos, na época. Era o Padre Gustavo da modesta Paróquia de Nossa Senhora de Guadalupe, Protetora dos Nascituros. Uma igreja simples, sem qualquer ostentação. A nave principal, talvez abrigasse umas quarenta pessoas. Mas isso ocorria somente em dias de casamento. No restante, os poucos fiéis de sempre, pessoas de mais idade e tradicionalistas.

Há muito, o povo do interior de São Paulo perdera sua convicção nos ritos da fé. Criam em Deus, Jesus e eram quase todos devotos de Nossa Senhora. Gustavo tinha a mais absoluta certeza disso. Porém, não viam mais nas Igrejas o caminho para chegar a Eles, aos seus Salvadores e Protetores – A Igreja precisa se encontrar com o povo novamente. Ter o unguento para suas aflições e temores – lembrava-lhe o velho Padre Anselmo, titular de fato da paróquia, porém já bastante alquebrado pela idade e incapaz de celebrar sequer uma das duas missas diárias.

Foram três bons anos, aprendendo com o Velho, rezando as missas diárias e ouvindo seu rebanho no discreto confessionário, ao fundo da igreja. Até aquele sábado.

Ouviu Dona Anita, uma senhora miúda, quase esquelética, estragada mais pela desnutrição e maus tratos da vida do que propriamente por seus 70 anos de vida. As mesmas mazelas e inocentes pecados de sempre, da briga com a neta, da discussão com o genro, a quem jurava respeitar – mas que me tira do sério - como ouviu seu Nestor, o prefeito da cidade. E do mais humilde ao mais poderoso, ninguém lhe confessava algum pecado que merecesse uma preocupação maior com a saúde moral da comunidade. As vezes, instigava-os até a um trabalho social, junto as populações menos favorecidas como forma de alívio para o tormento e punição pelo pecado confessado. Uma novena, algumas ave marias e pai nossos, mais habitualmente. Se os moradores da cidade tinham pecados maiores, não era ao seus ouvidos que os confessavam – e pode ter certeza que eles tem, meu filho. Pecados inomináveis! - brincava o Padre Anselmo. Mas Gustavo gostava de ouví-los, por vezes ingênuos, noutras tentando “enganar um pouquinho à Deus e ao Padre”, mas fundamentalmente, comparecendo e mostrando a importância que poderia haver em um par de ouvidos pacientes.

Foi então que Padre Gustavo ouviu um abrir diferente da portinhola de seu confessionário. Um abrir cuidadoso, quase sorrateiro, diferenciado de todos os outros que estava habituado a ouvir. Deveria ficar feliz. A possibilidade de um novo fiel, de alguém mais em comunhão com a Igreja e com Deus. Porém, no seu peito sentiu um incômodo, um aperto. Suspirou, espantando seus temores e procurou se concentrar em suas obrigações, declamando o início da confissão, ao ouvir o assento do banquinho rangir.

- Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

- Amém – respondeu uma voz grave e rouca do outro lado da divisória em treliça - Padre, me perdoe, porque eu pequei.

- Que o Senhor esteja em seu coração e palavras para que, arrependido, confesse seus pecados.

- Eu nunca me confessei antes, Padre. Vivia e acreditava que Deus me perdoaria por meus pecados, sem que alguém precisasse interceder, quando chegasse a hora. Porém, percebi estar errado – a rouquidão da voz solenemente fez uma pausa. Talvez buscasse perceber a repercussão de suas palavras, talvez quisesse apenas tomar um fôlego e organizar suas idéias para prosseguir com seu relato. Porém, ao Padre Gustavo não restava mais qualquer dúvida: este era um homem sinistro e que estava por confessar um pecado abominável.

- O que importa para Nosso Senhor Jesus Cristo é que você se arrependa, confessando seus pecados. Ele pode a tudo perdoar, se for sincero o seu arrependimento.

- Hoje eu sou um homem feito, Padre. Quarenta e cinco anos, um cirurgião brilhante. Ganho muito dinheiro em São Paulo. Sou admirado e respeitado por todos meus amigos, clientes e colegas de profissão. E praticamente, atravessei o Estado para chegar nesta Igreja, de Nossa Senhora de Guadalupe, para confessar-lhe que minha história nem sempre foi respeitável assim... - e a Voz fez uma nova pausa. Padre Gustavo não resistiu a tentação e focou seu olhar sobre as frestas da treliça. A Voz tinha a tez bem clara, porém com bochechas rosadas, macilentas, cabelos levemente grisalhos. Um riso discreto permanentemente desenhado em seus lábios. O rosto que personificava a bondade, a retidão. Estatura mediana, talvez um metro e setenta, pouco mais pouco menos. Não era gordo nem magro. Vestia-se elegantemente, num terno cinza claro, gravata azul quase marinho, camisa reluzentemente branca e bem passada. E numa avaliação desta superfície diria-se – Ali está um bom homem – Porém, Padre Gustavo sentia em sua alma que não. E temia por cada nova palavra a ser dita.

- Minha mãe era uma puta, Padre. Não dessas que ganham a vida fazendo sexo. Mas por vocação mesmo. Não sei quem é meu pai. Possivelmente um dos muitos bêbados e drogados que ela levou para casa, nos finais de noite. Eu me lembro da primeira vez que a ouvi – a Voz sorriu levemente – morávamos num pequeno apartamento no centro da cidade. Dois quartos fétidos, sempre imundos, grudados parede a parede. “mete mais, mete mais seu puto! Me come!”. Eu tinha cinco anos, Padre. E passei a noite de olhos abertos, ouvido colado na parede do quarto, temendo por minha mãe. Pelas dores que estava sentindo... - E a Voz fez-se gargalhada. Alta, grave, descontrolada.

- Meu filho...

- Padre, é importante que eu conte, que o senhor saiba e entenda. É importante.

- Ele tudo sabe, filho. Você não precisa se defender ou se torturar. Apenas se arrepender...

- E eu me arrependo, Padre. Muito! Não desses pecadinhos. Não por ter colado o ouvido na parede. E nem por ter me escondido dentro do guarda-roupas dela, pouco mais de um ano após.

- Você...

- Eu precisava! Eu tinha que ver as imagens que me traziam os sons, os pesadelos... Era preciso saber. Só assim eu poderia ter meu sono e paz de volta, eu pensava...

Padre Gustavo ouviu um prolongado suspiro, carregado de dor e sofrimento. Pensou em abordá-lo novamente, dissuadi-lo de pormenorizar sua história. Mas sabia não ter forças para deter esse homem. Teria que ouví-lo até o fim.

- Então aconteceu numa sexta-feira de madrugada. E eu estava a tanto tempo lá dentro do armário, prensado por roupas, cabides e cobertores, que dormi. Acenderam a luz do quarto, passos trôpegos, cambaleantes. Risos embriagados. Acordei assim. Cuidadoso, pois me lembrava onde estava. Temia pela minha sorte se me descobrissem. Minha mãe tinha a mão pesada. E paciência nenhuma. Não lhe custaria nada me espancar mais uma vez... O guarda-roupas era antigo. Daqueles em madeira mesmo, entalhes e fechadura. Nada de aglomerados, daquela quase serragem que tentam nos vender hoje... Foi pelo buraquinho da fechadura que pude vê-los. Loucos, como dois loucos... - a Voz serve-se de mais uma pausa. Gustavo o vê baixar a cabeça e cobrir os olhos com uma das mãos. Mas não estava chorando. Parecia apenas esforçar-se para ter mais nitidez em suas lembranças – Eles se beijavam muito, exploravam seus corpos com violência, forçando frestas em suas roupas, até se livrarem completamente delas. E eu fiquei olhando. Minha mãe naquela cama, gemendo, urrando. Sua barriga lustrosa, gigantesca, de uma gestante de 7 meses. E o homem sobre ela, estocando forte, violento. Via a musculatura dele brilhar com o suor. Um peão de obra talvez, pela força física talhada no trabalho. Não havia sinais de cuidado ali. De academias ou malhação coordenada para a produção de músculos perfeitos. A força dele vinha da rudeza de sua vida – A Voz fez novamente uma pausa. Levantou a cabeça e colou-se à treliça divisória. Padre Gustavo podia sentir seu hálito – O senhor já viu uma expulsão de feto? Um aborto espontâneo?

Gustavo sentiu seu corpo gelar, ao mesmo tempo em que sua cabeça parecia dar voltas no ar. Aquele homem não era humano. Ele era mau, a personificação do mal. E Gustavo precisava escapar. Porém era tarde e sabia-se refém da Voz. Jogou a cabeça para trás, fechando os olhos. E as imagens vieram, claras, nítidas como em um cinema. Podia ver pelos olhos da Voz.

O homem, pele negra, brilhando de suor, penetrando a grávida com tamanha violência que se alegaria um estupro. Os gemidos enlouquecidos até o grito de dor – que porra é essa? - gritou o homem ao ver seu membro encharcado de sangue. Cambaleante, levantou-se da cama. A grávida se contorcendo na cama. O sangue derramando-se sobre o lençol, em golfadas, e ela implorando – me ajude, me ajude – Rapidamente ele se veste e sai em disparada do quarto, ainda calçando o tênis sem meia mesmo. Não buscaria ajuda alguma. Não se envolveria com policia – eu só queria dar uma trepada.

O choro apavorado de Débora – sim, esse era seu nome – Padre Gustavo podia senti-lo. Talvez a Voz o pronunciara, talvez sua imaginação o buscara. E então o garotinho, abrindo a porta do guarda-roupas e pisando no assoalho de madeira sem lustro algum – filho... Otávio. Corre, vai até o apartamento da Marta e chama uma ambulância. Pelo amor de Deus filho – e Débora se contorcia. Porém, Otávio permanecia ali. Olhando o sangue, olhando o sexo de sua mãe abrir-se e iniciar a expulsão de um pequeno bebê. A mulher gritou forte, seguidas vezes, dobrando-se ao meio. Otávio deu dois passos a frente, ficando bem próximo a mãe. Ela ainda olhou para ele, com os olhos suplicantes – chama ajuda meu filho. Vai... - E foram as últimas palavras que Débora disse, antes de ser atingida pelo ferro de passar roupas, que Otávio trouxera de dentro de seu esconderijo. Não houve tempo para protesto ou surpresa. A mulher simplesmente desabou, rosto desfigurado, crânio amassado.

Otávio se sentou na cama, separou as pernas da mãe. A criança ainda não havia sido expulsa completamente. Então, com suas mão aos redor da cabeça, puxou-a até que saísse por completo. Parecia sem vida, morta como a mãe. Tocou em sua pernas, balançando-as. Empurrou sua cabeça para os lados. E então, a coisa mais estranha do mundo aconteceu: um choro, vindo daquela menina suja de sangue. Otávio deu um pulo, assustado. Porém, se conteve e ficou olhando a criança mexer convulsivamente as pernas e os braços. Foram uns dois minutos. Não mais que isso. E o ferro de passar silenciou a criança.

Padre Gustavo arfava. Sentia suas roupas cerimoniais grudadas ao seu corpo. Transpirava descontroladamente e percebia-se possuído pela história que ouvia. Era um estranho dentro de seu próprio corpo. Não tinha mais o domínio de si próprio. Submetido a uma história hedionda, sem poder gritar por socorro, sem poder evitar as imagens que vinham-lhe à mente.

- E eu fugi de lá, Padre. Na verdade, calmamente saí do apartamento e busquei refúgio nas ruas. Vivi assim por algum tempo. Até que Dona Lígia resolveu me tirar da rua. Me levou para sua casa, legalmente procurou se informar sobre quem eu era. Mas nada havia. Ninguém para reclamar minha posse. Apenas minhas histórias inventadas sobre um abandono. Frequentei boas escolas, me dediquei muito, porque tinha um objetivo definido na vida: ver um nascimento novamente. E assim, me tornei ginecologista e obstetra. Nunca tive filhos meus. Porém, trouxe muitos ao mundo. Tive poucas mulheres. Todas clientes grávidas em estado avançado, adulteras ou mães solteiras. E, Padre, como eu trepei! Forte, vigoroso. Mas tudo isso era pouco. Não me tirava a dor, a angústia. Perto do que acontecera antes... era muito pouco. Então... - a Voz fez uma pausa profunda, mediante um suspiro que prenunciava o fim de sua história - Eu vou deixar um jornal sobre o banquinho. Esta foi minha 13a. vítima. A décima terceira mulher grávida em quem provoquei um aborto e matei: mãe e criança – Otávio se afasta da treliça e recosta-se sobre a parede - Me perdoe, Padre, porque eu pequei. E me arrependo com sinceridade e verdade em meu coração. Me arrependo profundamente, com a alma doída. Não suporto mais essa vida de mortes e sangue. Mas não tenho forças para resistir a essa necessidade, a essa angústia. Só o seu perdão poderá me dar a paz e a redenção para me livrar dessa maldição. Por piedade, Padre: dê-me seu perdão. Eu lhe suplico.

Padre Gustavo abana a cabeça em, sucessivos “nãos” - Como poderia? Como esse homem ousava pensar que tudo era tão simples assim? Era um louco, insano, que invadira sua mente com esta repugnante história, sua crueldade – pensava Gustavo, torturando-se profundamente na esperança de retomar sua lucidez – Eu não posso! Nem Deus poderia... o que você fez, doutor Otávio... eu não posso!

- Então não há esperança para mim. E nem para as gestantes que eu possa encontrar... Padre, faça-me um último favor. Reze à Nossa Senhora de Guadalupe. A prece em favor dos nascituros. E peça a ela que interceda por mim. Que obtenha o perdão dos que sacrifiquei.

E numa fração de segundos, um clarão, um estrondo. O corpo de Otávio tomba e arrebenta a portinhola do confessionário. Os poucos fiéis na igreja ainda chegam a tempo de verem o Padre Gustavo ajoelhar-se frente ao cadáver, fazer o sinal da cruz em sua testa ensanguentada e dizer-lhe – Então vá. E não peques mais.

Na mão de Otávio, ainda fumegava o cano do revólver calibre 38. Nos olhos de Padre Gustavo, incontidas lágrimas lhe diziam que sua profissão de fé o tinha abandonado, ao estampido daquele disparo.

domingo, 2 de agosto de 2009

Além da justiça de Deus

ALÉM DA JUSTIÇA DE DEUS
Domenium


O som abafado das pás escavando com extrema frenesi ressoava em seus ouvidos, sendo a salvação para os lamurios fúnebres que ouvirá durante muito tempo debaixo daqueles escombros. A esperança tomou formas quando viu a luz adentrar pela senda que pouco a pouco aumentava. Januário estava coberto por terra e sangue. Retido por um pavor inexplicável, teve apenas força para dizer: “O sangue de Javé tem poder! Glória senhor!”. Ao sair do buraco seus olhos vislumbraram a voracidade da destruição e uma pequena multidão de curiosos que cultuavam a busca por novos sobreviventes; o jornal nas mãos de uma senhora, dizia: “Aquecimento Global: furacões devastam Estado”. Januário, pastor devoto, faz o sinal da cruz ao ver aterrorizante manchete.

- Venha senhor, vamos para ambulância. - consola, Moacir, o bombeiro, observando o estado débil do debilitado homem. Notando a vontade inviolável de suas mãos ao segurar um curioso rolo de papel manchado com sangue.

A razão operou de forma estranha, breve e soturna na mente de Moacir. Não foram necessários 10 segundos após o seu imediato dizer: “Senhor, estão todos mortos aqui!” e a leitura do estranho rolo: “Lista dos escolhidos por Deus”. Onze nomes riscados a sangue! Como dito, não foram necessários 10 segundos; um disparo ecoou em meio a destruição, um corpo tombou no chão.

- Realmente não há nenhum sobrevivente aí. Procuremos em outro lugar! - Concluiu Moacir com a sua fumegante justiça automática em punho.


Fim



Imemoravel Templo das palavras
http://domenium.blogspot.com/

sábado, 1 de agosto de 2009

O lado escuro da mente

Salve, salve povo congelado! :D

Como eu sempre gosto de coisas novas, variantes, hoje vou postar um conto relacionado com RPG (Role Playing Game), que é outra paixão minha, ainda que "adormecida" pela falta de tempo para jogar. Quem quiser maiores detalhes sobre RPG, o próprio site onde peguei este conto tem aos montes, além de outras fontes. Jogando "RPG" no Google tem milhares de sites que explicam o jogo, mas mesmo quem nunca jogou e nem sabe o que é isso, e acha que RPG significa apenas Reeducação de Postura Global (terapia), o conto é interessante e independente.

Este aqui eu retirei do site www.rpgonline.com.br , espero que gostem. O nome do autor esta abaixo, no texto (na verdade, o pseudônimo dele).

Não reparem na quantidade de espaços que eu coloco no texto abaixo, nem com os ------ que eu coloco, esta tralha aqui, que é do Google, mesmo dono do Orkut, tem o mesmo problema do Orkut: você enche de espaços para centralizar algo e posta, quando vai ver, ele come os espaços e o que era para ser centralizado, fica no começo da linha. O mesmo se dá entre os parágrafos: eu deixo um espaço, ele não reconhece e junta o texto, dificultando a leitura, então dou sempre 2 espaços, se ele comer um, sobrará um. Não sei se isso acontece só comigo ou se é bug do sistema, sei que acontece.

Uma boa leitura, neste sábado frio e chuvoso. Os meteorologistas falaram que ia sair o sol hoje, mas vai ver que ele estava sem o seu capote (e touca - tem touca para o tamanho do sol?) e preferiu não sair, ficou nas profundezas do céu, escondido em sua toca celestial...

Saudações!

N.E.I.'.

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-------------------> O lado escuro da mente

Às vezes nem os olhos abertos ajudam a compreender uma situação!

Autor: [D&D] Frost Hyral
Publicado em 3 de Março de 2008 às 16h27



Às vezes nem os olhos abertos ajudam a compreender uma determinada situação. Em certos momentos eles servem apenas para confundir ainda mais, contradizendo com o que sua cabeça deseja acreditar, vendo coisas que não deviam estar ali. Era isso que acontecia com Roy naquela noite, mas não apenas a visão contribuía para confundi-lo, os ferimentos e a fraqueza também o deixaram assustado. Como ele foi parar ali? E talvez algo mais importante, que diabos de lugar era aquele?


Não conhecia aquela estrada, não conhecia aquelas árvores mortas, aquela poeira, aquelas rochas, nem a vegetação rasteira, mas isso não era o que mais o perturbava, mas sim o que iluminava a existência dessas coisas: o fogo que queimava restos de corpos e carroças que se espalhavam por toda estrada e além dela. Os rostos estavam desfigurados demais para serem reconhecidos, as carroças destruídas demais, não havia nenhum sinal de cavalos, não havia nada que ele conhecia, até que seus olhos foram ao encontro de Clara, ela estava a poucos metros, jazia inerte próximo a uma rocha. Roy tentou se aproximar, foi então que notou que estava caído, seu casaco estava sujo com alguma coisa e suas pernas eram como um fardo que ele não conseguia carregar.


Arrastar-se com a ajuda apenas de seus braços era como escalar alguma coisa, porém ainda mais difícil devido a seus ferimentos, era como se suas mãos pegassem fogo sempre que forçavam o chão. Foi uma luta difícil, mas no final ele chegou até Clara. Não podia abandoná-la ali, ela havia salvado suas vidas inúmeras vezes, deixá-la seria como deixar uma parte de si mesmo. E após a dúvida sobre os pedaços que havia visto, se alguns deles não eram seus, não podia arriscar perder mais nada. Finalmente conseguiu colocar suas mãos em Clara e a analisou totalmente, algo faltava. Ela estava descarregada.


Um ruído próximo tirou sua atenção da arma, aparentemente, alguém também se encontrava confuso. Era um homem que já aparentava mais de meio século, sua barba e o que restava de seu cabelo já se encontravam em um meio termo entre o cinza e o branco. Estava tão sujo quanto o outro, embora ferido em uma hemorragia terrível. Roy percebeu nesse momento de quem era uma das pernas que vira ao acordar.


— Ah! Droga, bastardos, olhe o que fizeram! Eu sabia que eles viriam, mas de onde? Foi tudo tão rápido!


O velho parecia dizer mais para si mesmo do que para qualquer outro, mas ficou apreensivo quando escutou o galopar de cavalos em algum lugar próximo. Roy só conseguiu distinguir o som dos estalos do fogo quando o outro silenciou. Chegaram tão rapidamente perto dos dois feridos que ambos se surpreenderam. Os homens montados eram sete no total, o que os liderou desceu de seu animal e retirou o chapéu, o que fez Roy perceber que também utilizava um. Seus dentes eram podres e seu rosto suado, seus olhos eram fundos e negros, o cabelo lembrava capim já morto, em suas costas carregava uma carabina, muito parecida com Clara. Roy fitou-o por alguns segundos e então se lembrou vagamente de quem era o homem, seu nome era Bob Conrad.


— Woaah. Que confusão os senhores aprontaram aqui, não é mesmo? — disse Conrad olhando mais para Roy do que o velho. — Cheguei a pensar que o ouro também tinha ido junto com toda essa gente.


Roy não conseguia entender sobre o que o homem estava falando, nada fazia sentido para ele naquele momento. A não ser as dores dos ferimentos em si mesmo que ele começava a diferenciar a origem. A dor na lateral de seu corpo provavelmente viera de algumas costelas quebradas, algumas pontadas de dor em alguns lugares diversos surgiram de algumas concusões e sua perna foi definitivamente baleada.


— Monstros, foram vocês que fizeram isso! — O velho manifestava uma raiva que parecia superior ao que ele podia suportar.


— Sim, fizemos, perdemos muitos dos nossos no processo, mas a tristeza que sentimos por eles agora vai desaparecer em breve quando ficarmos com suas partes da pilhagem.


— Conrad parecia se divertir.


— Malditos! Olhem para o que fizeram, será que não têm família?


— Não sei quanto aos outros, mas depois de hoje, se eu quiser poderei comprar uma.


Repentinamente, o ancião surpreendeu novamente Roy ao tentar se levantar e ir ao encontro de Conrad, com sua fúria maior que si próprio. Entretanto, nenhuma fúria consegue ser maior que uma bala, para ser mais exato, uma bala que entra em um lado da face e sai pelo outro deixando uma cratera quatro vezes maior. Conrad guardou a carabina novamente em suas costas. Aquele foi o momento em que Roy pareceu conhecer os outros homens que estavam lá.


Sabia que um deles era o responsável por conseguir pólvora, era um homem instruído e falava muitas línguas. Outro era um mexicano, mal falava inglês e sabia contar apenas até seis, o necessário para recarregar e recomeçar a matança. Os outros ainda eram desconhecidos, pois também as chamas já começavam a se apagar e a escuridão tomava conta de todos.


— Roy, você vem comigo agora. — Não era surpresa, se Roy conhecia Conrad a recíproca também era verdadeira.


— Nãao.... eu.... — O som da própria voz era estranho para o homem ferido, então ele decidiu permanecer no silêncio.


— Ah! Quem você acha que é para discutir? Para casa é que você não vai, isso se tiver uma.


Os sete homens haviam deixado uma carroça em um lugar próximo, Roy viajava jogado atrás de uma delas, outras pessoas também feridas estavam a seu lado, as infecções que podiam surgir dali eram inúmeras. Um dos homens havia levado Clara.


— Você vai simplesmente deixá-los levarem você? Deus sabe o que diabos vão fazer quando chegarmos vai saber onde! Seremos reféns com certeza, mas depois disso seremos inúteis! — Um homem que parecia ter morrido há dias era o dono dessas palavras. Roy pensou tê-lo reconhecido, qual era mesmo seu nome? William? Travis? Ele não conseguia lembrar, mas pelo que pouco conseguia recordar ele já devia estar mesmo morto, mas não tinha tempo para debates sobre vida e morte, queria apenas descansar.


— Hey, você é um tolo sabia? Alguém quer salvar sua vida aqui, eu já estou ferrado!


— Tudo que Roy queria era que o homem ficasse quieto. — Esse cara morto aqui do meu lado tem uma arma na cintura, você sabe atirar não é? É claro que sabe, hoje eu vi você matar muita gente, não venha me negar isso. Você é dos bons.


O homem ficou quieto depois que Roy pegou a arma e a escondeu sob o casaco, ao contrário de Clara, estava carregada.


— Jonas, Stuart e Michael morreram. — informou o homem que conseguia a pólvora. Roy acordou e olhou para os outros deitados na carroça e para o homem que os analisava, apenas ele estava se mexendo, ao seu lado o que havia falado com ele antes de adormecer estava calado até demais. Seu nome não era nem Jonas, Stuart ou Michael, até onde Roy conseguia se lembrar.


— Roy, você está bem? — Conrad apareceu para verificar e notou que ele era o único a se mover. Então estendeu a mão.


Aquele gesto, estender a mão, era uma marca de Conrad, não, na verdade, a marca era a pistola de carga única por baixo da manga que ele utilizava em seus cumprimentos covardes. Roy sabia que estava ferido demais, sua união com os mortos apenas piorou sua situação, seja lá o que Conrad preparava para ele, não seria mais possível, era dia, as montanhas estavam distantes, assim como as cidades, Roy morreria até lá.


— Foi o único a agüentar até aqui, considere-se um homem de sorte! — Conrad ainda estendia a mão.


— Talvez... um pouco de sorte para mim... — Roy tentou dizer. — Mas não para você. — Disse numa calma como se estivesse lendo uma receita de torta, então sacou a arma escondida com destreza. Alvejou Conrad, o homem da pólvora e um terceiro que não conseguia se lembrar, antes que esses pudessem perceber o que havia se passado. Arrastou-se para fora da carroça e olhou para onde os homens haviam acampado. Nenhum deles parecia estar a caminho, talvez tenham pensado que os tiros pertenciam a Conrad e os outros com a finalidade de matar os doentes como ele. Estavam enganados, Roy pensou, os tiros não pertenciam a Conrad nem aos outros homens, mas as balas agora eram deles.


A perda de consciência já se tornara algo comum. Roy sabia que havia caminhado o máximo que pode naquele deserto. O sol havia esquentado tanto sua cabeça que ele não mais se importava, pensamentos fluíam em seu cérebro de forma desordenada como um quebra-cabeça. Ele caiu mais uma vez, primeiro de joelhos, depois de todo o corpo, mas antes que navegasse pelo rio da inconsciência, conseguiu amontoar algumas peças de suas lembranças:


Estava em seu cavalo, Clara em mãos, uma caravana passaria por ali a qualquer momento.


— Temos homens infiltrados. — O homem no outro cavalo disse. — Eles sabem o sinal.


— Soube que há um grande carregamento de pólvora na caravana, além do ouro. — Disse Roy.


— Sério? Então eles deviam trazer mais homens com eles.


— Acho que já estão em grande número.


— Não o suficiente.


— Humph... De todo modo, vou preparar para dar o sinal. Deseje-me sorte.


— Boa sorte. — Disse Bob Conrad.

--------------------> F I M


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